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“Poção do sono”: Mistura de mel, sal e óleo de coco faz adormecer num minuto?

29 Ago 2023 - 10:54
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“Poção do sono”: Mistura de mel, sal e óleo de coco faz adormecer num minuto?

Circula nas redes sociais a receita de uma suposta “poção do sono”. Segundo o autor de um vídeo partilhado no TikTok, “misturar mel, sal marinho e óleo de coco e ingerir esta mistura ou adicioná-la a um copo de água morna e bebê-la” faz com que se “adormeça num minuto”. É mesmo assim? Existe evidência científica de que esta mezinha faça adormecer rapidamente?

Mistura caseira de mel, sal e óleo de coco faz adormecer rapidamente?

Não há evidência que comprove que esta mistura de mel, sal e óleo de coco faz adormecer rapidamente. Quem o adianta é Vânia Caldeira, pneumologista e especialista da Comissão de Trabalho de Patologia Respiratória do Sono da Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPN), em declarações ao Viral.

Dos três ingredientes referidos na publicação, segundo a especialista, “o mel é o ingrediente que tem mais evidência, até porque tem uma substância na sua constituição, que é um derivado da melatonina”. Portanto, pode ter “algum impacto no sono”, aponta.

Por outro lado, também existem alguns estudos, “mas com pouco substrato, acerca do óleo de coco”, em que se sugere que “possa contribuir para um sono mais reparador”.

No entanto, na visão de Vânia Caldeira, a adição de sal não faz qualquer sentido. “Temos uma população muito hipertensa” e adotar este hábito “dispara o risco cardiovascular”, sobretudo em indivíduos hipertensos. 

Além disso, no sono, “é suposto a frequência cardíaca e a tensão arterial estarem baixas”, salienta. Na apneia do sono, por exemplo, “cada vez que há uma paragem respiratória, a tensão dispara e os batimentos disparam”. Portanto, reforça, “estar a tomar sal antes de dormir é contraproducente”. 

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De facto, sabe-se que “o que comemos pode ter mais ou menos influência no sono”. Por isso mesmo, “há muito tempo que se busca a dieta ideal para se dormir melhor”. 

Contudo, como explica a pneumologista, as pessoas devem encarar estas misturas como suplementos. O que isso quer dizer? “Sempre que tomamos suplementos corremos o risco de “não haver, de facto, uma eficácia comprovada e de os efeitos adversos não estarem, muitas vezes, estudados”, clarifica.

“Enquanto qualquer fármaco tem de passar por anos de segurança comprovada, nestes casos isso não acontece”, acrescenta a investigadora. 

Na perspetiva de Vânia Caldeira, “o maior problema – e isto é transversal a todos os suplementos que ao sono dizem respeito – é, muitas vezes, a não resolução do problema”. 

Isto porque “as pessoas andam, às vezes, anos a fazer suplementos, nunca procuram ajuda, a situação vai-se perpetuando e nunca resolvem o problema”, justifica.

Como melhorar a qualidade de sono?

Segundo a especialista do sono, há hábitos a adotar para dormir melhor, mas “dependem sempre um bocadinho de pessoa para pessoa” e do que se consegue encaixar na rotina.

Regra geral, é importante percecionar o jantar como “o momento a partir do qual a pessoa está a preparar o sono”. Além disso, o jantar “deve ser uma refeição ligeira, sem refrigerantes, sem bebidas energéticas, sem café, sem álcool”, defende. 

Também se aconselha as pessoas a criarem em casa “um ambiente o mais calmo possível, com o mínimo de exposição à luz: desde a luz da sala, à luz dos dispositivos eletrónicos e da televisão”.

Para mais, “se gostar de ler, pode ler um livro, ou, se gostar de ouvir música, também pode ouvir uma música calma”, recomenda Vânia Caldeira. No fundo, deve-se criar “um ambiente tranquilo, que nos vá acalmando do nosso dia, do nosso stress, de tudo em relação ao trabalho”. 

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Noutro plano, não é aconselhado fazer tarefas relacionadas com trabalho, “nem fazer atividades que excitem a pessoa, quer do ponto de vista emocional, quer do ponto de vista de atividade”. 

Deve-se “evitar o exercício ao final do dia, a não ser pilates ou meditação”, por exemplo.

Além disso, a investigadora recomenda que se encare o quarto como “o sítio para dormir”. “Não fazer outras atividades no quarto – como trabalhar, estar no computador, ou ver televisão ” – também é importante.

Assim sendo, só se deve ir para o quarto com sono e, “uma vez lá, ter o quarto otimizado em termos de isolamento de ruído e luz e ter uma temperatura confortável”. 

O que fazer quando as insónias não passam?

De facto, “a predisposição para ter insónias é diferente de pessoa para pessoa”. Mas, com frequência, “os doentes em consulta têm um fator precipitante” que leva ao surgimento de dificuldades em adormecer.

Pode ser “um luto, uma depressão, uma mudança de trabalho, um divórcio”, exemplifica Vânia Caldeira. Aliás, acrescenta, na pandemia, o facto de as pessoas ficarem fechadas em casa “foi muitas vezes o fator dessas insónias”.

Perante um mesmo motivo, “há pessoas que conseguem lidar com isso, seguir a sua vida e voltar a dormir melhor” e pessoas que não conseguem.

A especialista aponta que “há pessoas que criam comportamentos errados” – como mexer no telemóvel, ligar a televisão ou comer, quando não conseguem dormir e, sem querer, “acabam por perpetuar o problema”.

Como saber quando recorrer a um especialista? Por norma, “a insónia torna-se crónica quando é uma situação persistente no tempo”. Se entre três a seis meses “a pessoa não conseguir, de facto, melhorar, está na altura de procurar ajuda”. 

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O que acontece com frequência é que as pessoas “têm a ideia errada de que ir ao médico significa serem automaticamente medicadas com fármacos e ficarem dependentes de fármacos o resto da vida”, refere Vânia Caldeira.

Contudo, hoje em dia, “o tratamento da insónia raramente passa por fármacos”. Claro que, de forma pontual, e “em fases mais agudas, acabamos por fazer aqui algum ajuste e alguma medicação”.

Ainda assim, “o tratamento é sempre muito baseado na terapia cognitivo-comportamental, que passa por corrigir os tais comportamentos errados”, frisa.

Por fim, a insónia também pode ser apenas um sintoma e não o problema em si. Nas mulheres, com frequência, o sintoma predominante numa apneia do sono depois da menopausa é insónia”. 

Como explica a pneumologista, “a pessoa tem despertares durante a noite, que depois geram insónia”, por isso,  o doente “não consegue dormir continuamente”. O motivo, nestes casos, é a apneia do sono

Outra condição em que a insónia é um dos sintomas prevalentes é a síndrome de pernas inquietas. “A pessoa não sabe por que acorda a meio da noite, por que tem insónia, mas tem que ver com movimentos repetitivos dos membros inferiores”, esclarece. 

Em ambos os casos, “se a pessoa não procurar ajuda, vai continuar a fazer suplementos ou a automedicar-se e tem um problema que, sendo tratado, resolve a insónia”, conclui a especialista em sono.

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Este artigo foi desenvolvido no âmbito do European Media and Information Fund, uma iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian e do European University Institute.

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Categorias:

Sono

Etiquetas:

Produtos naturais

29 Ago 2023 - 10:54

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